Escrito em 2007, o
artigo sobre o 13 de maio, do companheiro Miranda continua da maior atualidade.
No momento em que a história sobre a abolição é contada por aqueles que querem
apagar a luta de classes. No momento em que os ministro STF ganha 20% de aumento
real e por unanimidade julgam constitucional as chamadas cotas raciais. É
um momento de reflexão de todos que lutam por igualdade de fato e de direito,
de todos que lutam por trabalho igual salário igual, de todos que lutam por
serviços públicos de qualidade e gratuitos para todos, de todos que lutam
contra o racismo. E estas lutas estão completamente conectadas com a luta pelos
direitos dos trabalhadores, de sua organização, portanto de sua unidade
enquanto condições supremas para abrir caminho que abolirá a exploração do
homem pelo homem, para uma sociedade organizada para a satisfação de todas
necessidades de todos seres humanos, falamos da luta pelo Socialismo.
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As revoltas conquistaram a Abolição
*José Carlos Miranda
Infelizmente, os estudantes desconhecem a verdadeira história da abolição da escravidão no
Brasil. Na escola, desde o ensino fundamental, as únicas recordações que ficam
no imaginário popular são da princesa boazinha que “libertou” os escravos. E
por aí vai se reproduzindo a “história oficial”.
Brasil e Cuba foram os dois últimos países do mundo a eliminar a escravatura como base de um modo de
produção. A Guerra da Secessão (1861-65), nos Estados Unidos, cobrou o preço de
mais de um milhão de mortos para que se encerrasse a escravidão e, de fato, se
unificasse a nação. O Haiti se tornou a primeira nação negra das Américas
quando, após ter conquistado a libertação, em 1794, com uma insurreição dos
escravos negros, expulsou a bala e a facão, em 1803, os colonialistas
franceses.
No meio do século XIX já
não havia mais como manter a escravidão no Brasil. As lutas contra escravidão
negra tomavam conta do país. De longe vinha o Quilombo de Palmares, sobre o
qual não é preciso se estender. As homenagens que até hoje recebe Zumbi são o
testemunho da luta heróica e dolorosa dos negros, hoje parte integrante da
classe trabalhadora brasileira, para se libertar de toda opressão e exploração.
Inúmeras revoltas populares se somavam às rebeliões de escravos, aos assaltos
às fazendas e assassinato de fazendeiros.
Nas décadas de 1830 e
1840, o país havia vivido algumas das suas maiores rebeliões ou guerras internas.
Entre 1835 e 1840 a província do Grão-Pará (atualmente os estados do Pará,
parte do Amazonas, Amapá e Roraima) conheceu as revoltas da “cabanagem”, nome
dos negros, índios e mestiços, que viviam nas cabanas. Eles chegaram a tomar
Belém e instituir um governo próprio, em choque frontal com a monarquia
escravagista. Esta grande luta popular pagou um tributo de 40 mil mortos
tombados na luta por liberdade e igualdade.
A Balaiada, no Maranhão,
que durou de 1838 a 1841, teve como herói da monarquia o militar que ganhou ali
seu primeiro título de nobreza, o Barão de Caxias (uma das mais importantes
cidades do Maranhão), que viria a ser o Duque de Caxias. Como herói das classes
populares, teve o negro Cosme, líder de um quilombo, que comandou cerca de três
mil homens armados em combates contra as tropas da monarquia. Mesmo na Guerra
dos Farrapos, que se estendeu de 1835 a 1845, no Rio Grande do Sul, quando a
elite local chegou a proclamar a República do Piratini, os negros jogaram um
papel importante e conquistaram a reivindicação de libertação de todos os
negros que lutaram ao lado de Bento Gonçalves contra a monarquia.
O Brasil chegava ao fim
do século passado marcado por rebeliões e imerso numa profunda crise econômica.
Esta situação tensa, fruto do agravamento constante das crises econômicas no
mercado mundial, juntava-se à pressão internacional da burguesia, que não podia
permitir a continuidade da concorrência de produtos da mão-de-obra escrava. Mas
a escravidão não caiu de madura: foi derrotada pela primeira luta popular de
caráter nacional da história brasileira.
A luta abolicionista
juntou negros, brancos, mestiços e mulatos. Entre seus líderes, estavam
ex-escravos. Enquanto, nas fazendas, os escravos se rebelavam e fugiam,
ajudados pelos abolicionistas, outros atores entravam em cena. Os trabalhadores
das ferrovias e os operários gráficos, núcleos de uma classe operária ainda em
formação, participaram ativamente do movimento, escondendo os negros fugidos e
imprimindo os panfletos anti-escravistas. Essa história permanece oculta da
maioria dos jovens estudantes.
A princesa Isabel,
quando assinou a Lei Áurea, estava firmando um documento de derrota – a prova
da falência do próprio Império, que caiu no ano seguinte. Mas, para aqueles que
trabalhavam a terra, e praticamente só sabiam fazer isto, o fim da escravidão
não significou o acesso a terra. Significou, isso sim, seu despejo das
fazendas. E assim os escravos foram expulsos de um modo de produção e a
maquinaria da economia se desenvolveu através de uma abundante mão-de-obra
livre, basicamente estrangeira, imigrada com amplo financiamento do Estado para
suprir as necessidades da atrasada burguesia rural brasileira. É por isso que a
burguesia brasileira nasce no campo e não nas cidades.
O Império pintou a
imagem do 13 de Maio como um presente da princesa benfeitora. Os defensores das
chamadas políticas de ações afirmativas pintam hoje o 13 de Maio como a mentira
da princesa malfeitora. A divergência é superficial, pois ambos se apegam ao
ato da autoridade, ocultando atrás dele as lutas de classes no Brasil e no
mundo neste período. É como atribuir o fim da ditadura militar à candidatura de
Tancredo Neves ao Colégio Eleitoral, escondendo as lutas dos trabalhadores e
estudantes que derrotaram os generais.
Comemorar o 13 de Maio é
trazer a tona a verdadeira história de lutas do povo brasileiro. É homenagear
centenas de milhares de brasileiros que lutaram e, em muitos casos, deram sua
vida para que se inscrevesse na lei o fim da escravidão. Acima de tudo, é retomar
o fio de continuidade da luta pela igualdade que inspirou os abolicionistas.
Nós temos a convicção de
que não se derrota o racismo por meio da divisão dos trabalhadores e estudantes
em “brancos” e “negros”, como querem os defensores das leis raciais. Só se
derrota o racismo superando o imenso abismo entre as classes sociais, pela
extensão dos serviços públicos de qualidade para todos e pela conquista de
empregos para todos os trabalhadores, seja qual for o tom da sua pele.
*José Carlos Miranda é
vice presidente do PT Caieiras (SP) e Coordenador Nacional do Movimento Negro
Socialista (MNS).
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